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16 de ago. de 2013

O Que Eu Quero, Afinal?

Frequentemente me deparo com gente exasperada falando sobre feministas—vocês não se satisfazem com nada, vocês sempre enchem o saco, o que vocês querem da gente afinal de contas, hein?

Pois então, meu amigo. Hoje é teu dia de sorte. Tô aqui pra te contar.

Eu vou te contar o que eu quero de vocês, não da sociedade em si porque isso já é muito mais complexo.

Vamos começar pelo básico, né? O que faria alguém se sobressair positivamente na minha visão chata e fechada feminista? O que faria eu parar de (ou não começar a, melhor ainda) berrar com alguém na internet ou na vida real? Essencialmente, o que faz um bom aliado aos meus olhos. Porque, na verdade, o que eu quero de vocês é bem simples se formos parar pra pensar. Só quero solidariedade.

E antes que digam, sei lá, que o que eu vou dizer é muito difícil (eita preguiça, hein) ou que nenhum homem é assim, ei, ei, parem antes porque, DISCLAIMER: esse post é baseado em homens que eu conheço e adoro. Wow. Wowwww. Surreal. É. Eu sei. Vamos lá.



1 – QUERO QUE RECONHEÇAM QUE A OPINIÃO DE VOCÊS NÃO É IMPORTANTE NESSA QUESTÃO
Eu sei que dói ouvir desprezo na voz de alguém quando se trata da tua opinião. Sabe como eu sei? Porque eu já passei por isso zilhões de vezes! Porque sou menina! Yeah! Então, sabe. Maneirem aí. Mostrem que concordam que essas zilhões de vezes foram injustas, e mais ainda, mostrem bom senso. Não tem como a águia dizer pro peixe como é nadar contra a correnteza. Aceitem que tem coisas que vocês inerentemente não têm como saber, porque nunca experienciaram e nunca vão experienciar. E aproveitem que são burros nesse aspecto, porque opressão não é divertida. 
Vocês até podem ter voz, mas ela nunca vai ser mais relevante ou sábia que a minha nesse quesito. E não tem nenhum problema nisso, eu não gosto de vocês menos por isso. Só aceitem isso e estaremos de boa.


2 – MAS QUE FAÇAM A PARTE DE VOCÊS MESMO ASSIM
Não adianta também ficar “não tenho voz então nem me meto”, o que é quase um mimimi em si. Consumam. Leiam bastante. Leiam coisas de pessoas que sentem isso na pele. Leiam coisas de gentes de lugares diferentes, religiões diferentes, tudo diferente. Não tenham medo de compartilhar as coisas só porque não é a luta pessoal de vocês. Se envolvam. Perguntem a opinião de pessoas feministas que conhecem sobre tal assunto. Ouçam bastante sem pitaco, opressão não precisa de feedback. Pensem criticamente sobre situações que pareçam erradas, tentem identificar o que exatamente tá errado. É tudo exercício. Ajam. A voz de vocês infelizmente vale mais pra muita gente do que a minha, e muitas vezes vocês parecem ter mais credibilidade por serem “objetivos”. Sabe, usem o privilégio pra beneficiar as pessoas com menos. Falem em público quando estiverem numa situação problemática—xinguem o cara que tá alisando a moça no ônibus, xinguem alto, se metam no meio quando mulheres têm menos poder. Vocês podem parar tanta coisa ruim, é simplesmente triste ficarem na passividade total.


3 – QUERO QUE SAIBAM ERRAR DIREITO
Ninguém muda da noite pro dia. Todas as pessoas são condicionadas pela cultura em que vivem, e isso fica tão dentro da gente que demora meses, anos, décadas pra tirar. Vocês vão errar. Eu vou errar. Todo mundo vai. Múltiplas vezes. Tentem pedir desculpa direito. Sem essa de “desculpa se tu ficou ofendida”. Não. Tomem responsabilidade. “Desculpa, o que eu disse/fiz foi problemático, vou tentar não repetir.” Se vocês não acham que foi ruim, perguntem o que causou ofensa. Ouçam com atenção. Tratem com importância. Não justifiquem, não vão pra defensiva automaticamente, isso não ajuda ninguém. E, por favor, tentem ao máximo entender e aceitar. Se mesmo assim ainda parecer que a pessoa está exagerando, peçam desculpas mesmo assim e não repitam na frente dela, pelo mínimo de decência possível. Talvez no futuro vocês olhem pra trás e entendam qual era o alvoroço—eu sei porque eu já passei pela exata situação.


4 – E QUE NÃO SE FAÇAM DE VÍTIMAS, NUNCA, NUNQUINHA, JAMÉ
A tentação é fortíssima. Parece tudo tão injusto, vocês estão sendo tratados tão mal, pessoas não param de gritar com vocês. É chato. Vocês se sentem inúteis. Um lixo. Nada que fazem serve. Bom, desculpa ter que dizer, mas é assim que a gente se sente grande parte do tempo. Os sentimentos individuais de vocês não são nada comparados—e parem um momento pra avaliar isso seriamente: se isso que vocês sentem é tão ruim, como é que deve ser ter a sociedade institucionalizar esse sentimento todos os dias a um grupo inteiro de pessoas mesmo quando elas não fazem nada? E como é que deve ser quando isso não é nem a pior coisa—quando o grupo ainda sofre milenares abusos físicos, de agressão doméstica a estupro a assassinato? Botem os sentimentos de vocês em real perspectiva e aceitem que eles não são válidos nesse contexto, e deem graças à divindade de escolha (ou falta de) que esse é o maior dos problemas que vocês têm que enfrentar. Empatia, galera.



Isso não vale só pra feminismo, óbvio, mas é o único ponto no qual eu posso realmente dizer o que quero. Em contrapartida, são as coisas que eu tento sempre fazer ao tratar das opressões que não sinto—racismo, homofobia, cissexismo, e por aí vai na tão temida política correta (cujos “opositores” devem inclusive ganhar um prêmio por semanticamente admitirem que algo é correto e ainda assim veementemente não quererem ser sequer associados a).

O que eu quero é que vocês queiram ser associados ao correto. Que ajudem e ajudem bem. Tem muita coisa que eu não entendo de gente machista, mas essa fábula que contam pra si mesmos que as minhas reivindicações são muito complicadas e exorbitantes talvez seja a que mais me confunde.

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