páginas

19 de fev. de 2014

Frozen Não É A Epítome Feminista Que Eu Mereço

Eu tive minhas reservas pra ver Frozen. Me recusei a ver no cinema porque não queria contribuir monetariamente e quase por birra quis boicotar totalmente e não assistir. Acabei vendo no Putlocker pra me sentir mais no direito de julgar. Talvez a minha opinião seja vista como parcial porque já não gostava do filme (ou da ideia dele, melhor dizendo) antes de ver, mas vê-lo só me deu mais argumento ainda pra achar blé. Aqui trago meu arsenal.


Mas, Betina, Por Que Você Não Gostava Desde Antes?


1) A Brancura, ou Disney, Para De Fazer Princesas Iguais, Faz Favor

Rapunzel, RapunzElsa, RapunzAnna, e ElsAnna em Uma Grandiosa Demonstração De Diversidade.
Não, a Anna ter cabelo mais avermelhado que a Rapunzel não distingue as duas. As meninas que assistem Disney merecem muito mais do que um desfile de bonecas loiras de olho claro com narizinhos empinados e cinturas surreais. "Mas e a Tiana? E a Mulan? E a Jasmine? A gente já tem um monte de princesa não-branca!", por favor. Ter cinco não-brancas e cinco brancas não é representação igualitária. Brancos constituem 15% da população mundial (fonte: ask.com. Eu poderia pesquisar um número mais oficializado, mas hm, vocês duvidam que seja um número tão baixo?). De 21 princesas, pra ter uma representação adequada da população mundial atual, 11 seriam asiáticas (5 do leste, 4 do sul, 2 do sudoeste), 3 negras, 3 brancas, 2 latinas e 2 árabes. São 18 princesas não-brancas pra cada 3 brancas. Atualmente, contando a Elsa e a Anna, são 9 branquelonas pra 4 de outras cores. Isso significa que pra ter uma representação adequada a Disney precisaria fazer os próximos 158 filmes com princesas não-brancas pra deixar o treco equivalente. Se passarem os próximos dois séculos fazendo isso eu perdoo Frozen. Até lá... hm. Nah.


2) Os Homens, ou Pra Um Mantra Feminista Essa Adaptação Foi Bem Podre Em Representação Feminina

Basicamente só o que os executivos da Disney queriam saber, suponho
Frozen supostamente é inspirado num conto chamado A Rainha da Neve. Quantas mulheres aparecem em Frozen? As duas protagonistas, Anna e Elsa. A mãe delas, que... morre aos 9 minutos ou por aí, como de praxe, óbvio, e... Hm... Ok, tudo bem, não tem muitas, mas ter as duas protagonistas principais já conta, né? Tá, contar tecnicamente conta, mas quando se leva em conta que A Rainha da Neve tinha 9 personagens mulheres pra 2 homens e 4 não-humanos é meio que ridículo. A Disney adaptou uma história na qual a personagem principal salva o amigo dela (damsel in distress às avessas, ou seja, Tudo Que Eu Quero Na Vida) com a ajuda de várias mulheres ao longo da jornada pra uma história em que as duas únicas personagens femininas passam 80% das vidas separadas. Era necessário isso? O Kristoff precisava ser homem? (Precisava, claro, porque senão não teria o romance que todos os fãs desse filme amam fingir que não existe). Até a rena e o boneco de neve tinham que ser masculinizados? Por que Olaf não podia ser Olga, ou Sven ser Svenja? Que diferença faria pra história? Fazer a escolha ativa de que uma história precisava de menos personagens femininas me deixa tão enjoada, cara. E ainda receber a fama de ser O Filme Mais Feminista Ever é a cerejinha no topo desse tapa na cara.



Ok, Betina, Mas Por Que Você Não Gostou Depois De Ver?


1) A História É Sem Sal E Mal Desenvolvida


Eu podia passar horas falando sobre o quão decepcionante a história de Frozen foi, mas essa crítica diz tudo e muito mais do que eu penso, de maneiras muito mais eloquentes e elaboradas. Pra quem não fala inglês, ou tá com preguiça, aqui vai um resumão: personagens não foram bem desenvolvidas. Pontas não foram atadas. Muita coisa irrelevante e desnecessária, pouca construção narrativa decente. Não tive sentimento honesto de satisfação no final por causa desses defeitos. E eu meio que entendo por que a história foi tão medíocre, já que Frozen supostamente passou por centenas de alterações de roteiro. Mas isso não perdoa uma história medíocre vindo de um estúdio com tantos recursos e talentos. E, talvez mais importantemente...


2) O Troféu Metafísico de Hino Feminista/Progressivo

Eu não vou mais aceitar essa merda. Diz tudo, Elsa.
Eu suportaria Frozen muito mais se não tivesse toda essa maldita hype excessiva. Frozen não merece a coroa que recebe, e o meu problema com isso é diminuir a qualidade do que nós como audiência esperamos de nossos filmes. Se a Disney olhar pra essa recepção crítica e pensar "ótimo, todo mundo amou, não precisamos mudar mais", hã, eu vou ter um sério problema de Decepção Clínica. Vocês querem idolatrar um filme da Disney por ser feminista e progressivo? Eu vou dar um filme pra vocês, meu Deus. Eu vou dar três, em ordem de importância.

Lilo & Stitch

Ohana, caramba. Esqueceram?
Pra tanta falação de "primeiro filme de irmãs que se amam!" pessoas parecem ter uma baita amnésia pra esquecer dessa maravilha de filme. Quem liga que a Lilo e a Nani não são tecnicamente princesas? A história delas é cem vezes mais bem formada e satisfatória que a de Frozen de qualquer jeito. Elas não precisam ser princesas, são perfeitas do jeito que são. E nota: de brancas elas não têm nada, Deus seja louvado. A Nani é uma adolescente de 19 anos que trabalha pra sustentar uma irmã numa casa gigantesca. Ela tem um interesse romântico mas expressa não ter tempo pra (e, portanto, vontade de) ter um relacionamento, porque tem que se dedicar à irmã — o que, pra mim, é muito mais genuíno do que o estilo "romance não importa só que no final vai importar de qualquer jeito já que existe o Kristoff, galera! Olha só como é conveniente fingir radicalizar mas dar essencialmente na mesma de sempre!" de Frozen. A Lilo, como personagem solo, é mais desenvolvida que as duas irmãs escandinavas juntas. A gente vê ela não lidando bem com a morte dos pais, ela sendo solitária e teimosa e excêntrica, e ela é só uma criança. Que personalidade que a Anna e a Elsa têm? A Anna é... desastrada. Ok. É Isso. A Elsa não é nada. As duas são bonitas. Sei lá. Tanto faz. Quem liga, elas são mulheres de qualquer jeito, pff.


Atlantis

Aposto mais apropriado: "O Filme Esquecido"
Incluído mais pelo fator racial do que feminista, porque wow, gente com pele escura em papéis importantes, Deus me livre, o que deu na Disney? O povo de Atlantis tem toda uma cultura riquíssima (mais rica do que qualquer coisa exposta em Frozen) que só os vilões da história não respeitam. Mas mesmo o fator feminista ainda conseguiu ser mais eficiente do que Frozen. Audrey Ramirez é uma menina adolescente que trabalha como mecânica e especificamente menciona uma irmã que luta boxe? Oi, papéis de gênero? Vocês acabaram de levar um soco na cara (e não, o Kristoff ser mais "macio" não chega nem aos pés disso). Posso acrescentar também que a Audrey não segue um padrão de beleza típico da Disney já que é bem mais baixinha e gordinha do que a típica princesa e mesmo assim é linda. E ei, que tal a mãe da Kida que se sacrifica pra salvar Atlantis, numa cena tão curta e ainda assim mais envolvente do que qualquer coisa que a Elsa demonstrou? Parece uma piada que ninguém lembra desse filme quando vai bater palma pra Frozen.


Valente

Aqui vai um relacionamento platônico bem elaborado, caso não se lembrem
Em terceiro lugar porque tenho problemas com o fato de todo mundo nessa história ser branco, mas, hm, como é que agem como se Frozen fosse mais feminista que Valente? A história inteira de Valente é centrada no conflito e na interação constante entre duas mulheres. Uau, Anna e Elsa se amam, beleza, só que elas ganham o quê, 10 minutos totais de interação na tela? Patético. Merida e Elinor praticamente só interagem uma com a outra. Os homens de Valente só recebem um subplot bem irrelevante que, mesmo assim, adivinhem, é resolvido pela Merida com a inspiração da mãe dela. O romance na trama é usado 100% instrumentalmente, só pra aumentar a tensão entre a Merida e a mãe. A Merida não fica com nem beija nenhum menino no final, nem como prêmio de consolação. Ela tá totalmente desinteressada em menino algum, e a história respeita isso. A Elsa não recebe interesse romântico, mas ela não recebe quase nada pra início de conversa — a gente não faz a menor ideia se ela quer alguém ou não, diferente da Merida que expressa querer ficar solteira. Já a Anna, que tem uma música toda sobre querer encontrar amor, hã... Nem vou me dar ao trabalho.


Mas, Betina, Eu Achei Bonitinho!

Tudo bem. Não tenho problema algum com gente que gostou do filme (mesmo se eu tivesse, ei, quem liga pra minha opinião? Me chama de recalcada e continua a vida). Eu só não aguento botar num pedestal quando tem coisa tão melhor por aí que merece bem mais crédito do que Frozen. Ei, eu também acho Anna e Kristoff uns fofos, também cantei "Do You Wanna Build a Snowman?" com vozinha aguda, etc. Esse post não condena completamente o filme, só a visão de que ele é a perfeição que a Disney nunca antes criou. Não é nem perfeito nem único. Próximo, por favor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário